sábado, 19 de janeiro de 2013

Dicas de leitura: escritores chineses

Em termos literários, 2012 foi basicamente um ano que dediquei a ler muito sobre a China, e grande parte das minhas leituras tinham esse objetivo preparatório. Ou "pós-operatório", pois continuei fascinada pelo tema e buscando respostas após o meu retorno para tudo o que vi e senti nesse país tão contraditório, complexo e talvez por isso mesmo fascinante.

Na biblioteca em frente à minha casa me aconselharam a escritora WANG Anyi, que faz muito sucesso na China. 

Esse livro, "Le chant des regrets éternels" (não vou me aventurar a escrever em chinês e não sei com que nome foi eventualmente traduzido no Brasil), recebeu um dos mais importantes prêmios da literatura chinesa.  Nele, o principal personagem é a cidade de Shanghai, começando pelo final dos anos 30, passando pela promulgação da República Popular da China, a Revolução Cultural, e a retomada e abertura econômica dos anos 80. Mas fala igualmente da consição feminina, tema preferido da autora e que faz dela uma verdadeira sensação entre as chinesas, que se reconhecem de uma forma ou de outra em seus personagens. Realmente gostei muito do livro, que começa como um ensaio, mas é verdade que algumas passagens do livro me irritavam, creio que era porque a forma de pensar dos chineses é muito diferentes da nossa! Uma excelente descoberta!


Esse livro "Les Lumières de Hong-Kong" já se situa principalmente em Hong Kong como o próprio nome diz. Fala desses chineses que vão tentar a vida em Hong Kong, em busca de fortuna, de luxo, ou simplesmente de liberdade ou uma outra forma de viver. Fala dos descendentes de chineses que, mesmo nascidos em outro país, para os outros serão sempre chineses, mas para os chineses não o são mais... E fala sobre uma relação de amor e ódio para com essa cidade. 
Não fui até lá, mas fiquei com muita vontade de mergulhar nessa atmosfera!!!

Eu já tinha falado de QIU Xiaolong, muito conhecido por suas histórias policiais. Normalmente vamos encontrar em sua escritura uma China e principalmente uma Shanghai (que ele conhecia como a palma da sua mão) de antes dos anos 1990, quando ele imigrou para os EUA. Por exemplo, o bairro moderno de Pudong, com seus arranha-céus, não existia ainda na sua época, apesar se já ser um país em forte transformação.

Porém esse livro é muito diferente: são dezenas de histórias bem curtinhas que se passam nesse conjunto habitacional popular de Shanghai que desafiou as diferentes épocas, e principalmente de seus moradores, que souberam sobreviver e se adaptar a tudo. De 1949 aos dias atuais, as histórias falam de personagens de diversas categorias sociais, mas cada uma mais tocante do que a outra, sempre em relação direta com eventos importantes da história recente do país. Um recito fácil de ler sobre as transformações sociais na China! Um olhar sobre uma China não muito conhecida e nem compreendida.



Também gostei muito dessa escritora Zhang Xinxin, muito conhecida (e lida) na China dos anos 80. Em seu livro "Sob a mesma linha do horizonte", ela fala da juventude atual chinesa e fala PARA essa nova geração: a história banal de um casal, seus encontros e desencontros. A cada capítudo eles vão alternando o papel de narrador, e vamos entrando na intimidade desses dois. Seus sonhos e ambições não são lá muito diferentes dos nossos, mas a forma como eles vivem, ah, isso é um pouco diferente sim! 



Também li esse outro livro dela (ambos bem fininhos e de leitura fluida), porém esse último é bem intrigante: uma história um pouco fantástica, irreal, inspirada livremente de uma verdadeira "febre" que houve na China nos anos 80, quando algumas pessoas pensavam que podiam enriquecer cultivando uma variedade muito especial de orquídeas. Surpreende! Mas fica a mensagem do quanto as vidas podem mudar quando o que mais importa é o dinheiro... vale lembrar que para um povo que não podia comprar o que queria durante décadas, nem vestir ou comer o que queria (quanto menos morar onde desejasse!), quando eles vêem essas possibilidades praticamente ilimitadas do dinheiro, eles ficam um pouco perdidos... 

(Como se a corrida pelo dinheiro e poder fosse um tema puramente chinês e não deturpasse bem outras sociedades mais próximas de nós...)

 Cisnes selvagens
A escritora Jung Chan conta a história de sua avó, nascida em 1909 em plena China Feodal, dada em concubinato a um "Senhor da Guerra", muito comum naquela época. Com a chegada do comunismo, essas e outras práticas foram abolidas (como o horrível costume de impedir que os pés das meninas cresçam através de métodos extremamente dolorosos, fazendo com que elas tenham pés defomados e atrofiados!) passando pela história de sua mãe, pertencente à juventude comunista e seu pai, um um revolucionário comunista do grupo dos intelectuais. No início elite desse sistema, durante a revolução cultural eles são denunciados e vão sofrer o exílio, a separação e os trabalhos forçados. Ela mesma (a escritora), no início fervente defensora do regime do do presidente Mao, aos poucos vai se revoltando contra o sistema. Mais tarde ela consegue retomar seus estudos e imigrar para a Europa, onde transforma essas lembranças de família em um livro de repercussão mundial. As transformações políticas, culturais e econômicas são bem marcantes a partir da vida dessas três mulheres. Incrível como o mais simples indivíduo viu a sua vida fortemente influenciada por cada uma dessas mudanças. 

Croquants de Chine são duas histórias. A primeira é um pouco humorística até: um camponês vai até a cidade grande visitar e ajudar o irmão. Mas ele não entende nada desses códigos sociais da "cidade", se sente completamente perdido, mais aos poucos vai fazendo seu aprendizado. mas o que reina na cidade é o poder do dinheiro e os prazeres da carne... Quase uma história de vender a sua alma ao diabo... Em uma linguagem crua e cortante. 
Porém a segunda história foi realmente triste e chocante para mim. Fala de uma realidade nas províncias mais afastadas que é o comércio de mulheres. Quando mais longe da civilização é a localidade, maior a disproporção entre o número de homens e mulheres. E os homens são capazes de pagar o que podem e o que não podem para se casarem!!! Algumas dessas uniões são vividas de forma muito satisfatória por ambas as partes, história de unir o útil ao agradável, mas quando uma jovem é sequestrada, violentada das piores formas possíveis, humilhada, depois vendida e finalmente recuperada por seu pai, sua vida nunca mais será a mesma... um caminho sem volta em direção a um dos piores fins. 
Lembro que na época fiquei muito tocada pelo tema, não conseguia dormir com aquelas imagens horríveis na minha memória. Muito triste saber  que as mulheres sofrem as piores violências em todos os cantos do mundo e não poder fazer nada...

Outra escritora imperdível para quem se interessa pelo país: Xinran. Imperdível!


Então, gostou das dicas? Interessou-se por algum desses livros ou temas? 
E o que você mais gostou de ler em 2012?

7 comentários:

Unknown disse...

Olá Milena

Adorei as dicas.

Está no ar o SORTEIO INTERNACIONAL ELLIS BEACH WEAR

AMIGA da MODA BY kinha

Enaldo Soares disse...

Cisnes Selvagens é um livro sensacional. Da mesma autora e com o seu marido, o historiador inglês Jon Halliday, há a monumental biografia de Mao, que desmistifica por completo o ditador chinês e lança enorme luz sobre a história da China maoísta.

Elvira disse...

Oi Milena.
Nunca li nenhum autor chinês mas adorei suas dicas. Vou dar uma olhada lá na biblioteca.
Recentemente passou pelas minhas mãos o livro "Cisnes Selvagens" e eu dei uma olhadinha. Um livro bem forte onde mostra bem como o regime comunista marcou a vida dequelas pessoas. Fiquei triste com o fim do pai dela.
É muito bom "entender" a cultura de um país antes de uma viagem para não ficar somente naquela visão de turista.

Bjs.
Elvira

http://saia-justa-georgia.blogspot.com/ disse...

Muito interessante tuas leituras. Nao conheco nenhum desses livros e fiquei bastante curiosa...

Agora, ter uma biblioteca em frente de casa é um sonho, nao?

Bjos

Natalia Itabayana disse...

Milena,
adorei a lista de leitura, vou me lançar na literatura asiatica, acho que é fundamental pra pratica clinica que tenhamos uma noção, basica que seja, na organização de outras culturas, porque nos permete compreender melhor certos conflitos que emergem. Conheci um casal recentemente num jantar, ele francês e ela chinesa, que tem uma filhinha de quase dois anos, e ela me falou um pouco sobre a criação das crianças na China e fez um contraponto com a criação aqui na França, falou de suas dificuldades de mãe e angustias que são relacionadas justamente ao sistema de valores diferente. Acredito que a literatura é um bom caminho pra aproximação com a cultura oriental.

Milena F. disse...

Enaldo, ainda não li esses outros livros que vc citou, mas estou aqui me coçando!!!

Elvira, o livro é realmente bem triste e forte. Tb fiquei muito comovida principalmente com a história do pai dela, que tanto deu, além de não ser reconhecido, foi brutalmente traído e sofreu duramente as consequências!

Georgia, realmente em frente. Mas sou tão preguiçosa que as vezes até passo a minha carta e uma listinha ao meu marido e ele me traz... Ele vai 5 vezes por semana, eu nem tanto!

Natalia, eu adoro tentar entender outras culturas, na prática clínica é fundamental, mas é verdade que no Brasil eu sentia menos necessidade de ir em busca de toda essa "diversidade", porém aqui em Paris, com tantas diferenças estruturais entre os diversos povos que compõem a sociedade atual, se a gente não se informa acaba interpretando de forma errônea alguma situação e até o dia a dia fica mais difícil! Adoro ler, tem gente que não leva em conta o aprendizado que podemos tirar de "romances e/ou ficções", mas eu acredito que podemos aprender, já que o livro foi escrito por uma pessoa que está inserida em uma determinada cultura e seu livro se vendeu ou foi lido. Ou seja, essa pessoa tem algo a dizer que pode me interessar.

Day disse...

Oi, MIlena, como vai?
Já faz um tempinho que descobri seu blog, e desde então sempre volto pra ler mais um pouquinho.
Agora que achei seus posts sobre livros vou voltar mais vezes... Comecei também a ler alguns autores chineses e estou adorando.
Abraço